A TRÉGUA DE MARIO BENEDETTI( 1960). Editora: L&Pm, 2008. (CRÔNICA ANTIGA 20/11/2008)

A TREGUA



Depois que li o livro, comecei a refletir sobre a palavra trégua. Procurei no dicionário, por perceber que só tinha em meus pensamentos só um significado desta palavra, como um período de paz entre as guerras.

sf (gót trigwa) 1 Suspensão temporária de armas e hostilidades; armistício (mais usado no plural). 2 Cessação temporária de trabalho, dor, incômodo ou desgraça; descanso. 3 Interrupção. 4 Férias. Não dar tréguas: não dar um momento de descanso. Pôr tréguas a: interromper.(Michaelis)

A história é de um senhor que por alguns momentos, foge do cotidiano maçante para viver um amor com uma mulher mais jovem. Experimenta o desejo e a ternura em simbiose, marcando sua vida “ medíocre”. Publicado em 1960, o romance é o mais respeitável construção narrativa do escritor e está no hall das obras-primas da literatura latino-americana a partir da década de 60 do século XX. A estrutura da narrativa possui a forma de diário, que mostra ótica pessimista e irônica do protagonista em relação ao seu dia-a-dia. Evidencia, também, a falta de uma comunicação profunda entre as pessoas, que se acomodam em um mundo de frivolidades e aparência. O personagem principal vivencia esta situação com os três filhos, moram na mesma casa com eles, entretanto não conhece realmente seus pensamentos mais íntimos.

A história de amor, que vive com a moça, é a trégua da sua vida inócua. Viúvo há muitos anos, sobrevivia entorpecido em furtivos casos amorosos, trabalho burocrático e a casa. Porém, a felicidade dura pouco...

Segunda-feira, 24 de fevereiro

É evidente que Deus me concedeu um destino escuro. Nem sequer cruel. Simplesmente escuro, É evidente que me concedeu uma trégua. A princípio, relutei em acreditar que isso pudesse ser a felicidade. Resisti com todas as minhas forças, depois me dei conta por vencido e acreditei. Mas não era a felicidade, era apenas uma trégua. Agora estou outra vez metido em meu destino. E é mais escuro do que antes, muito mais. “

No romance contem vários pontos do livro, que evidenciam problemas sociais do Uruguai como a corrupção e a falta de pulso dos cidadãos tomar iniciativa de reverter este quadro. Destacarei uma passagem que o namorado da filha do protagonista comenta:

“ ...Há gente que entende o que está acontecendo, mas que limita a lamentar. Falta paixão, esse é o segredo deste grande globo democrático em que nos convertemos. Durante vários anos, fomos serenos, objetivos, mas a objetividade é inofensiva, não serve para mudar o mundo, nem sequer para mudar um país de bolso como este. Falta paixão, e paixão gritada, ou pensada aos gritos, ou escrita aos gritos. É preciso gritar no ouvido das pessoas, já que sua surdez é uma espécie de defesa, de autodefesa covarde e malsã. É preciso que se consiga despertar nos demais e vergonha de si mesmos, que se lhes substitua a autodefesa pelo auto-enojamento. No dia em que um uruguaio sentir nojo de sua própria passividade, esse dia se converterá em algo útil.”

Esta passagem não deixa de ser adequada a toda América Latina. Lógico que muitas diferenças entre Uruguai e Brasil, no entanto, estruturalmente há bastante semelhança. Não pude deixar de pensar, que a história do livro se encaixaria muito bem na sociedade brasileira. Portanto, todo mundo precisa ter o direito de uma trégua uma vez na vida.

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